O que temos aqui é uma passada a limpo por todo um repertório repleto de canções com forte apreço social e emocional que foram transmitidas por seus músicos da forma mais profissional e verdadeira possível. Para qualquer fã e apreciador de boa música, o registro do último show do Forfun é um documento para guardar com carinho no cofre do coração a sete chaves. Danilo Cutrin, Vitor Isensee, Nicolas Fassano e Rodrigo Costa dominam o público e entregam tudo nessa história linda que não durou apenas um verão, mas sim exatos 14 verões.
Roani Rock
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Gravadora: Deck
Data de lançamento: 28/08/2022

Gênero: Hardcore/crossover
País: Brasil
Se você já está na casa dos 30 anos para 40 anos e reside no rio de janeiro, provavelmente vai ter alguma referência do Forfun. A banda era uma das grandes expoentes nos anos 2000 do hardcore que estava estrondando no underground nacional. Junto ao Dibob e ao Scracho, eles eram uns dos pilares carioca da cena que estava em ascendência. O disco Teoria Dinâmica Gastativa de 2005 trazia todo aquele frescor da adolescência e irresponsabilidade repleto de guitarras distorcidas. Mas ia um tanto na contramão das bandas paulistas que ganharam a mídia, eles terminaram por ser cariocas demais, trazendo a realidade burguesa, com os rolés de surf, a pretensão de ter um carro massa e as gírias usadas para as desilusões e conquistas amorosas.
O álbum foi gravado pelo mitológico Liminha nos estúdios da Supermusic, selo filiado à Universal Music Brasil e teve o hit História de Verão como o grande acerto. Mas apesar disso, eles não estouraram nacionalmente de forma comercial. Entretanto, devido aos downloads de internet, do boca-a-boca e os cds demo vendidos nas apresentações, conseguiam lotar as casas de show de todo o Brasil. O segundo álbum, o Polisenso de 2008, gravado nos estúdios AR e Atemporal, e pré-produzido na Casinha onde eles produziram a maior parte do material e o que veio a se tornar o QG deles.
Nesse período o Forfun passou por uma mudança estrutural importante, o guitarrista Vitor Isensee passou a assumir os teclados e sintetizadores, dando uma repaginada no som para algo mais moderno com elementos da música eletrônica. A banda resolveu fazer um crossover de estilos também, abrindo para novas experiências mais voltadas ao reggae e ritmos mais groovados com um pouco de rap também. Esse mix de sons se uniu a uma maior maturidade nas composições com um viés mais politizado junto a conexão com o astral e natureza. No disco estão algumas das músicas mais populares da banda que sempre figuravam os setilists como Sol ou Chuva, Aí Sim, Suave, Eremita Moderno e O Viajante.
Em 2011, o Forfun lançou Alegria Compartilhada, um disco ainda mais carioca nas letras e ainda com a mesma pegada do Polisenso, caminhando para uma sonoridade cada vez mais baseada nas variações do reggae só que agora com um pouco mais de r&b americano e rap. Ele foi produzido por Daniel Ganjaman. O álbum teve um bom investimento dos caras e contou com participações muito especiais de carasque são influência deles como no caso de Black Alien, ex-Planet Hemp; Guto Bocão, mestre de bateria da Vai-Vai; Tiquinho, trombonista do grupo Funk Como Le Gusta; Fernando Bastos da Orquestra Brasileira de Música Jamaicana; Paulinho Viveiro que toca trompete na banda do Seu Jorge e Daniel Ganjaman, que além de produzir o álbum, participou de algumas faixas, tocando teclado e até cantando como backing vocal.
Fazendo essa repassada na jornada da banda, chegamos no ano de 2015, com eles fazendo a turnê do quarto álbum Nu de 2014 que não teve tanto apelo dos fãs. O álbum, segundo o baixista Rodrigo Costa em entrevista ao Clemente Magalhães do canal do youtube Corredor 5 já mostrava que a banda não estava com a mesma conexão de outros tempos por divergências até políticas e com isso a tour se tornou a última com o show na Fundição do dia 12 de dezembro de 2015 tendo sido escolhido como o da despedida.

É emocionante poder eternizar e dividir com nosso público, que é quem faz tudo fazer sentido, esse momento mágico e inesquecível que foi o último show do Forfun! O show tá lindo demais e foi incrivelmente registrado e editado pelo nosso camarada Daniel Ferro [ex-Emoponto] e sua competente equipe. Agradeço ao milagre da Vida por momentos como esse, aos meus irmãos de banda, a todo mundo que de alguma forma nos apoiou, especialmente nosso querido público. Espero que curtam, se divirtam e se emocionem!
Nicolas Fassano
Um revezamento de músicas do Polisenso e do Alegria Compartilhada ditam o começo do show, com Suave, Siga o Som e Quando a Alma Transborda criando uma vibe de conexão espiritual meio hipponga. Ambas as músicas tem seu peso, a primeira tem um baixo e batera violentos, com uma guitarra distorcida e Danilo e Rodrigo dividindo os vocais. Já Siga o Som, que também tem a dobradinha dos vocalistas entre verso e refrão, é um hardcore direto ao ponto que lembra o Teoria Dinâmica Gastativa, mas que tem uma forte presença dos sintetizadores do Vitor. Quando A Alma Transborda que é do Alegria Compartilhada parece uma música do Red Hot Chilli Peppers, com Vitor mandando o rap e o baixista Rodrigo cantando o refrão. Ela ainda possui um solo fantástico do Danilo e um naipe de metais fortalece o som.
A segunda música do Alegria Copartilhada a ser tocada é Largo dos Leões, um reggae que homenageia o carnaval carioca, onde a letra cita vários blocos que se apresentam na data festival como Bola Preta, Gigantes da Lira, Escravos de Mauá, Carmelitas, Volta Alice, Bagunça O Meu Coreto, Bangalafomenga, entre outros. Em seguida vem Eremita Moderno, música que por si só já menciona alguns artistas brasileiros, mas que Vitor resolve mandar um salve para o Planet Hemp, Rappa, Charlie Brown Jr, Ponto de Equilíbrio, Naturts, Dibob, Scracho, a música do Rio de Janeiro e a do Brasil todo.
Depois vem a explosão com Sol ou Chuva onde se nota o quanto o público gosta desse hit, uma das mais populares. Cigarras é uma das músicas mais longas do show trazendo solos e improvisos maravilhosos, mostrando toda a técnica do Danilo na guitarra. Mas após dois números bem populares o sarrafo subiu tanto que Muitos Amigos que traz a parte mais um pouco de rap, mas com um pouco de r&b e Mariá que também é mais na vibe do rap rock não combina tanto com o que estava rolando antes, deu uma quebrada, mesmo sendo faixas que trazem o destaque técnicos dos músicos, principalmente do incansável Nicolas na batera e do Rodrigo nos grooves do baixo.
Tropicália Digital mostra como a banda é capaz de fazer um funk no meio de todos os reggaes e hardcore, das músicas que eles fazem rap, essa é a que tem a letra mais interessante e faz a onda do repertório voltar a ganhar impulso. A real é que o show é longo e contém 31 músicas, mas afinal, são 14 anos de banda passados a limpo. Quem esteve presente aproveitou as quase duas horas de show. Termina que o repertório é muito bem montado, haja visto que Alforria após Tropicália Digital combinou bem. Depois vem outras duas do disco Nu, a boa A Vida Me Chamou e Considerações que é tipo um hardocre ska. Seguido o show, vem O Viajante que também é uma das que o público mais se identifica.
Após 15 músicas surge a primeira do Teoria Dinâmica Gastativa, Cara Esperto é uma das músicas mais populares do primeiro álbum com aquele pique de imaturidade adolescente, do cara com amor platônico. Mas aí vem um dos melhores momentos do show, Constelação Karina, uma música bem poderosa de letra motivacional que realmente mexe com o coração de qualquer um. Depois vem História de Verão que dispensa comentários. Outras do Teoria que são tocadas mais adiante são Hidropônica (possivelmente a Satisfaction do Forfun), Good Trip e Costa Verde (minha preferida). Faixas que tem um caráter de rock de estádio e trazem o melhor deles com hardcore com Vitor assumindo a segunda guitarra.
Minha Jóia que é uma balada conhecida pela versão no Circo Voador com Tony Garrido ficou mais intimista com todo o carisma dos caras e do naipe de metal. Cósmica que vai na mesma pegada parece uma música do Djavan e depois vem outra das mais populares, Morada; Talvez a faixa com a melhor letra da banda, atingindo o pico do climax. Em seguida Aí Sim, uma música bem pra cima do Polisenso que tem um pouco de rock de estádio. Dia do Alivio que também possui uma letra forte aparece nessa linha de músicas boas. O Mundo Vai Girar é tocada pelo batera Nicolas na guitarra e Vitor lembra que tudo começou com essa música. a faixa Coisa Pouca do Nu arma terreno para as outras músicas do Teoria Dinâmica que aparecem para ser tocadas, que é o momento que os fãs mais raiz esperavam.
Com o auge do show atingido, a banda traz Gruvi Quantico, Panorama, Bolo Cosmoman e Alegria Compartilhada praticamente anunciando a transformação que a banda iria sofrer nos anos seguinte se tornando o Braza que é basicamente uma banda de reggae. Rodrigo, que estava em outra onda, tanto musical quanto político/social saiu da banda, este foi o principal fator para o fim do Forfun e o nascimento do Braza em 2017 que segue numa crescente. O baixista fez parte de alguns projetos interessantes como o Tivoli que fez junto a membros do Ramirez, Drive e Dibob, e recentemente está com o Carranca.
Se a banda ainda estivesse na ativa estaria completando 20 anos, para quem os acompanha desde o início o registro ao vivo vem com uma nostalgia forte. Além de toda qualidade técnica do material, falo da qualidade do som e mix, mostra que os membros apesar de não serem mais uma força com a mesma ideologia e amizade de antes, seguem com carinho proporcionando um agrado aos fãs da banda que os formou como músicos e isso tem que ser prestigiado, principalmente se em algum momento da vida você foi a um show deles e gritou: “É a melhor banda do Brasil, FORFUN!”
Nota Final: 09/10