Winery Dogs e STP no Vivo Rio e Titãs Encontro no Jeunesse Arena: A magia não se perde, ela se transforma

Como já dizia Cazuza: “O tempo não para”. Essa afirmação batidaça, para o gênero rock é muito verdadeira, e ela pode ser traduzida na palavra adaptação. Muitas bandas que fizeram sucesso resistem ao passar dos tempos, seja por transformam seus sons de acordo com o estilo musical que vem fazendo sucesso, adicionando instrumentos e sonoridades, destoando completamente de sua essência ou por algumas serem tão enraizadas no conceito que não mudam de forma alguma suas concepções. No último caso, vira e mexe voltam as paradas de sucesso quando algum “clássico” seu é colocado em uma obra de potencial blockbuster. Os exemplos de artistas e bandas dentro desses dois conceitos é infindável, mas vamos falar sobre três grupos que se apresentaram durante a semana no Rio de Janeiro, dois bem enraizados no universo sonoro do rock dos anos 90/2000 na quinta feira e na sexta, um reencontro fora de série que nos transportou para os anos 80.

Na quinta feira o Winery Dogs que é a supremacia da técnica esteve no Vivo Rio para fazer a abertura do show do Stone Temple Pilots. Antes do show começar, conversando com algumas pessoas que estavam do lado de fora esperando a banda de abertura Velvet Chains acabar seu show (que pouco interessou para muitos), foi lembrado num debate sobre bandas os 16 anos de demora pro lançamento do Chinese Democracy do Guns N’ Roses, que devido ao perfeccionismo e a mudança constante de integrantes, perdeu o “time” e não conversava mais com o que era escutado na época de seu lançamento e soando de início ultrapassado.

Após o debate que foi de Monsters Of Rock de SP pro Hell Fest Open Air que foi em Paris, partiu a multidão para conferir o Winery Dogs. O espaço do Vivo Rio teve aquele esquema das cortinas pretas para iludir as bandas pela questão do pouco público. Se para as bandas isso é problemático, para transitar é maravilhoso, principalmente se você está na pista comum.

O super power trio composto por Ritchie Kotzen, Billy Sheehan e Mike Portnoy trouxe todo o glamour do hard oitentista. Kotzen, que foi chamado por alguns dos presentes de o “Lulu Santos do rock americano” devido a sucessão pop de hits do material da banda, mostrou que na verdade tem toda sua influência na forma de cantar inspirada em Paul Rodgers (Free e Bad Company) e nos arranjos e solos de sua guita com o que Eddie Van Halen o “ensinou” e inspirou, assim como o Mr.Big, banda que o guitarrista chegou a fazer parte e é um dos outros projetos do baixista Billy Sheehan. Kotzner, frente a tudo que foi dito anteriormente, ainda é simpático e brilha como frontman e solista, apresar de ser um pouco menos criativo que o guitarrista Paul Gilbert, o fiel parceiro de Sheehan nos últimos anos no Mr.Big.

Falando no baixista, ele tem um estilo único. ninguém toca como Sheehan, ele tem vícios técnicos que por mais que você já saiba que ele vai fazer, é sempre algo impressionante que te faz esboçar uma risada de incredulidade. Já Portnoy sem dúvidas foi um dos melhores bateras que já vi ao vivo, sua técnica é natural mas inigualável.

O que mais interessa no que é presenciado, além do set inquestionavelmente forte, é o quanto os músicos se divertem tocando essas músicas que facilitam mostrar o quão bons eles são em seus instrumentos. Gostei bastante de presenciar a sequência de 6 músicas da segunda metade do show, começando pelo hit Mad World, The Red Wine, a balada I’m No Angel, a altamente complexa Oblivion, a dançante Desire – que ao meu entender foi a melhor do dia – e Elevate, que fez o passado vir de volta para o futuro. Foi bem divertido, mas não acho que desbancaram a banda cabeça de chave.

Stone Temple Pilots ou STP, forma que foram ovacionados do início ao fim pelo público presente, é muito mais classudo e com raízes mais firmes no rock garagem graças a forma que os irmãos De Leo estruturam as músicas, com a inclusão de efeitos como o do slide guitar em boas partes dos hits tocados. Dean (guitarra) e Robert (baixo) juntos ao preciso batera Eric Kretz tem uma base bem sólida e há uma irmandade perceptível ao ponto de nem precisarem se olhar ao tocar. Inclusive nos improvisos, o que os permitem as vezes até se arriscar em meio a suas músicas, que ao vivo soam similares as gravações de estúdio.

Esse foi meu segundo show da banda e achei melhor que o de 2019 que tinha o frontman Jegg Gtt bem cru. Focado nos álbuns mais clássicos como Core e Purple, o espetáculo rendeu algumas surpresas agradáveis como Down, Silvergun Superman e Sin, músicas que nem sempre aparecem nos repertórios. Teve ainda o sinlge Meadow que representa a virada de chave da banda que começou com o álbum Perdida de 2020. Dito isto, provavelmente é a música que melhor representa o amor dos caras por sua obra e foi uma ótima forma do vocalista Gutt, que hoje em dia não parece mais um Scott Weiland genérico, mostrar ao que veio, podendo se arriscar por ele mesmo.

Bem interativo e com todos os membros da banda bem falantes com o público, esse foi um show ideal para os fãs do STP. Foi enérgico, repleto de hits e apenas Big Empty como balada, ainda arranjaram tempo de prestarem uma homenagem ao Rio De Janeiro com Dean ao microfone dizendo: “Apenas uma palavra: Jobim”, E assim arriscarem numa interativa jam com acordes de bossa nova mostrando assim um carinho pela cidade maravilhosa.

Na sexta feira, com um público formado majoritariamente por pessoas 30+, “com 32 dentes”, os Titãs fizeram o seu segundo show da turnê do encontro ser tanto uma nostalgia quanto uma novidade para aqueles que estavam no público e não puderam ver a formação original nem no seu início e nem no seu auge. O repertório foi bem focado nos álbuns mais populares gravados enquanto Arnaldo Antunes fazia parte, do primeiro até Titanomaquia, recebendo, basicamente, só Epitáfio como faixa fora dessa linha.

Sinto que nos últimos anos a banda meio que continuava na marra, num formato que apesar de ter o gigante Beto Lee na guitarra e Tony Belloto assumindo o vocal de algumas músicas, ficava sempre um sentimento de vazio nas performances. A volta de todos da formação original mais Liminha trouxe de forma clara não só um gás, mas energia renovada para Branco, Britto e Tony.

Hit atrás de hit, o show foi dividido ente um começo bem punk nas 13 primeiras músicas, um momento acústico em que os Titãs prepararam uma emocionante homenagem ao saudoso Marcelo Fromer, morto em 2001, trazendo a filha dele Alice para cantar “Toda Cor“, que é uma composição do guitarrista. Em seguida ela dividiu os vocais com Arnaldo em “Não Vou Me Adaptar“, que boa parte do público hoje pode se identificar com a letra.

Foram 31 músicas tocadas dando a dinâmica dos anos 80 prestigiando cada interprete de forma digna. Nando Reis tocando baixo, cantando Marvin e urrando punk nas faixas Igreja e Nome aos Bois, Arnaldo cantando Lugar Nenhum, O Pulso, Comida (fazendo seus passinhos clássicos de dança) e Televisão. A aparição de Jesus Não tem Dentes no País dos Banguelas, Tô Cansado, Porrada e Miséria foram um show a parte.

Momentos de forte emoção ocorreram com as faixas cantadas por Branco Mello também. O músico se recuperou de um tumor na garganta e praticamente rouco, arranjou um novo jeito de cantar fazendo os grunhidos guturais nas faixas como em “Eu Não Sei Fazer Música”, em Flores parecia que ficava mais fácil pra ele cantar do que falar, inclusive. Ele parecia ser o que estava mais feliz com o que estava acontecendo e na mesma sintonia, todos pareciam estar se divertindo como antes. Outra homenagem, que já era esperada, ocorreu em É Preciso Saber Viver que dedicaram ao saudoso gigante gentil Erasmo Carlos, compositor da obra que nos deixou no início do ano.

Falando em saudade, para todos aqueles que sentiam falta da gigante voz de Paulo Miklos, que ao meu entender é o melhor vocalista não só dos Titãs, mas também de toda a geração oitenta, poder ouvir Estado Violência, seus solos no sax em diversas músicas, além de seu berro nas tradicionais Bichos Escrotos e Diversão foi um verdadeiro privilégio. Fora as linhas vocais para os backing vocals feita por todos em todas as músicas, que saudade de preenciar isso!

Eles ainda vão se acertar durante a turnê em termos de arranjos. O maior destaque instrumental, por sinal, ficou por parte do remanescente Sérgio Britto e arrisco a dizer que foi a melhor performance do também vocalista que vi em um total de 5 shows que já fui deles. O baterista Charles Gavin também estava a vontade, nem parece que chegou a sair em algum momento do grupo e nem demonstrou cansaço, foi na pressão durante as duas horas de show. Eles certamente vão melhorar durante a turnê a questão dos errinhos técnicos básicos de equalização e de harmonia também para ficar mais orgânico, mas foi tudo acima da média e melhor do que o esperado.

Voltando pra casa, o refrão “Eu preciso de você agora, por favor meu bem não vá embora” ficou pairando em loop in na minha cabeça, simplesmente sinto que poderia ficar por horas testemunhando aqueles caras juntos de novo. Sei que é inviável, mas se voltarem ao Rio de Janeiro com essa turnê farei o possível para ver eles novamente. Na verdade, mesmo com os percalços de pouco público ou som mal administrado, novas formações ou retorno da melhor forma, a magia não se perde, ela se transforma e adapta, bem como coloquei no título desta matéria.

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