Bem vindos a mais um revisando clássicos, aqui analisamos discos atemporais que, de alguma forma, marcaram a história da música de maneira revolucionária. Traremos uma introdução ao álbum contando fatos que o fizeram importante para a carreira da banda, um faixa-a-faixa e por fim, citações das principais mídias especializadas em reviews. Hoje vamos falar do revolucionário disco evolucionário Is This It dos Strokes, responsável por fazer a mídia mundial questionar se estávamos presenciando “a segunda encarnação do Velvet Underground” ou a “maior banda de rock desde os Rolling Stones.”

INTRODUÇÃO AO ÁLBUM
O ano é 2001, o mercado da música estava formado por bandas e artistas que sabiam vender suas músicas através do videoclipe, deixando um tanto de lado a importância do álbum. Além disso, o rock, apesar de ainda ser dono do mainstream, estava carecendo de novidades, novos sons, novas vertentes. É aqui que entra o Strokes, uma banda que apareceu muito em consideração ao desenvolvimento maior da internet, e os meios de divulgação dentro de plataformas e redes sociais – seja as autorizadas ou as piratas.
São tempos em que não se tinha streamings e redes socais como facebook, orkut, twitter,Tik Tok ou os que eram mais ligados a música como o My Space ou Soundcloud. Os meios mais populares eram na base do peer-to-peer ou P2P, programas como o Napster e blogs que possibilitavam o compartilhamento de downloads de um determinado arquivo diretamente do computador de um ou mais usuários de maneira descentralizada, ou seja, gratuita. Nos anos 2000 se tornou uma febre e talvez o melhor meio de se ouvir música de forma alternativa a televisão. Foi através do formato MPEG-1 Layer 3, o conhecido MP3, que a era dos CDs começou a sofrer um incomodo.
Esse modo de ouvir música e ter sua distribuição não foi muito aceito pelas bandas mainstream e gerou brigas judiciais entre as gravadoras com os sites e blogs. Mas para grupos que estavam surgindo e queriam ter uma ascensão como no caso do quinteto new yorker foi uma mão na roda. Formada por Julians Casablanca [vocal], Nikolai Fraiture [baixo], Nick Valensi [guitarra], Albert Hammond, Jr. [guitarra] e Fabrízio Moretti [bateria],o novo grupo chamava a atenção pelo seu som, forma clássica de se vestir como os punks dos anos 70/80 e pelos sobrenomes dos integrantes, levando a definições como “berço de ouro” a certo patamar.
Todos estudaram numa das principais escolas de Nova York, a Dwight School e se olharmos que o vocalista e principal letrista da banda é filho de John Casablanca, dono da agência de modelo Elite e por ele ter como mãe a supermodelo Jeanette Chistiansen que foi Miss Dinamarca. Outras ascendências importantes viam por parte do baterista Moretti por ser brasileiro, tendo ido morar nos EUA aos quatros anos de idade – o que fez a banda ficar popular por aqui – e o segundo guitarra que é filho do guitarrista Albert Hammond que compôs a música Air That I Breath do The Hollies.
Apesar de virem de mesma escola e classe social, o famigerado The Strokes nasceu só depois de encontros e desencontros, até fora dos EUA, diga-se de passagem. Com o grupo formado e bem ensaiado, no bar Luna Lound os The Strokes fizeram um show com composições próprias e a partir dele tiveram uma mudança significativa na carreira. Isso devido a presença do produtor Gordon Raphael que tinha um pequenos estúdio de gravação chamado Transporterraum a poucas quadras dali.
O produtor não era conhecido, tinha produzido pouco e focava nos seus projetos autorais, as bandas Mental Mannequin e Color Twigs. Mas dentre os seus produtos, o que que dava para chamar de trabalho renomado, estava o disco do Green River de Seattle, banda que deu origem ao Mudhoney e ao Pearl Jam que comentamos no Revisando Clássicos do Ten.
Curiosamente Raphael tinha gostado mais da outra banda da noite, mas foram os Strokes que ligaram e se interessaram pela proposta do produtor. Ao mostrar suas músicas mais uma vez a ele, os Strokes se viram na situação de fazer “uma demo rápida e rasteira, com três músicas em três dias, que ficasse um trabalho rápido e barato” nas palavras do próprio, já que este iria para Seattle em breve tocar com sua própria banda. As três faixas foram gravadas com esta abordagem no seguinte modelo: três microfones na bateria, um microfone para cada guitarra e baixo, um microfone ambiente e mais aquele destinado aos vocais. Importante frisar que a banda gravou todos os takes ao vivo.
As músicas escolhidas para a demo foram The Modern Age, Last Night e Soma. O som que faziam era sujo e “moderno”, mesmo trazendo alguns elementos do proto punk e do rock beatnick de Lou Reed e seu Velvet Underground. O Television que também explorava riffs sujos mas melódicos assim como o Strokes faz, é outra grande influência notória, trazendo essa aura de rock de garagem. Os próprios Strokes corroboram com essa interpretação ao dizer para Raphael que queriam soar como “uma banda do passado que viesse numa máquina do tempo para fazer seu disco em 2001“.
Compromissados, os entusiasmados, ambiciosos e bem alcóolatras new yorkers se viram no olho do furacão com o lançamento de forma independente das três faixas. As gravadoras estavam atentas e sedentas para assinar com eles e o selo vencedor foi o da britânica Rough Trade Records, conhecida por ter lançado os The Smiths. Com o apoio do selo, esse EP chamado de The Modern Age recebeu mais três músicas além das já divulgadas e tinha boa parte do material que entrou no Is This It. O tracklist ficou: a faixa The Modern Age, This Life (depois renomeada como Trying Your Luck), New York City Cops, Soma, Someday, além da arrasa quarteirão Last Nite.
Passado o lançamento, o burburinho em torno de seu EP de estreia criou uma guerra de lances para a banda, entre as gravadoras Interscope, Epic e RCA, que o empresário Ryan Gentiles usou a seu favor. A banda firmou com a gravadora RCA-BMG como nova casa graças aos mimos que ela ofereceu como a não obrigatoriedade de lançar vídeo clipes, poderem lançar os discos pelo selo da Rough Trade, além de apoio para a confecção de cinco discos de estúdio com todos os direitos do álbum destinados a banda, algo não muito comum.
Apesar de assinarem com uma grande gravadora os Strokes não ficaram ludibriados e bateram o pé para que literalmente tudo fosse feito da forma que queriam. Eles enxotaram o popular produtor Gil Norton que trabalhou com os Pixies da produção do que veio a ser o primeiro álbum. Para eles o disco tinha que ter a urgência e as imperfeições que Gil e sua pretenciosa super produção não casavam. Por isso Julian e a banda não queriam outro produtor se não fosse Gordon Raphael, responsável pelo elogiado EP.
Na memória do produtor, o pedido deles era apenas ter “o som real e honesto de uma banda de guitarras tocando junta numa sala” e Raphael aceitou mesmo achando uma loucura demitirem um renomado produtor para trabalharem com um cara sem a mesma rodagem de experiência. O que pode ser considerado insanidade no fim deu certo. Promovido pela imprensa musical por sua interação de guitarras gêmeas e som melódico e influenciado pelo pop, Is This It alcançou o número 33 na Billboard 200 dos EUA e o número dois no UK Albums Chart , alcançando o status de platina em vários países. O disco “platinado” vendeu mais de um milhão de cópias nos EUA e mais de 600.000 no Reino Unido. Last Nite foi o primeiro single do grupo a entrar nas paradas americanas, alcançando o top 5 na parada Modern Rock Tracks dos EUA no final de 2001.
Quando gravamos as três primeiras músicas para a demo, eu nunca imaginei que aquilo seria um sucesso, porque ninguém gostava de guitarras em Nova York ou em Londres, era fora de moda. Mas quando o EP de “The Modern Age” foi lançado, todos na Inglaterra ficaram extremamente animados. Então quando começamos o álbum, tive a sensação de que o mundo inteiro estava esperando para aquelas músicas serem lançadas. Era um sentimento de excitação. Não era algo solitário, do tipo “talvez dê certo, a gente não sabe”. Era mais: “meu Deus, o público gostou dessas três músicas, então esperem ouvir as 11 faixas. O mundo vai à loucura.
Gordon Raphael em entrevista ao Tracklist, 2021

FAIXA-A-FAIXA
Um faixa-a-faixa se torna conveniente. Seguiremos a ordem numérica já que elas todas tem sim a sua importância, não só em termos mercadológicos, mas também para a história dos aqui envolvidos.
Is This It
O título do álbum, tirado do nome da lânguida faixa de abertura, é geralmente considerado uma questão – como colocado por cinco iniciantes friamente distantes. O vocalista Julian Casablancas explicou o título da música para a NME em 21 de novembro de 2009:
Essa música estava sem um refrão, então eu fiquei tipo, ‘Tenho que improvisar, vou descobrir algo’ e um dia cantei literalmente “é isso” no refrão e a música ficou pronta.
Para os músicos foi natural a escolha, mas eles confessaram que o álbum não recebeu o ponto de interrogação no fim da frase por uma questão estética. Segundo Casablancas na mesma entrevista a NME a escolha soava “profunda sem ser pretenciosa“.
The Modern Age
The Modern Age, o hit, foi usado pelo New Musical Express como destaque e fez a banda ficar muito popular na Inglaterra. É bem perceptível através desta faixa o quanto Julian gostaria de soar como Lou Reed mas a quebradeira e arranjos de guitarra os levavam para outra banda que Casablancas explicou o porque da similaridade.
As pessoas achavam que soávamos como Television, porque Television era uma banda de Nova York influenciada pelo Velvet Underground; É por isso que soamos como eles. Mas não era isso que estávamos ouvindo. Eu estava ouvindo Lou Reed.
Julian Casablancas a Lizzy Goodman
Falando a Lamacq em fevereiro de 2001, ele enfatizou que eles estavam tentando engarrafar a sensação que você tem quando ouve uma boa música “e é quase esmagadora”. “Você tem isso na música às vezes, muito poucas músicas assim e você tenta pegar essa essência”, disse ele.
Soma
Esta faixa do álbum de estreia do The Strokes tem o nome da droga fictícia do romance distópico de 1932 de Aldous Huxley, Brave New World . No livro, a população voluntariamente consome o elixir indutor de felicidade para aliviar seus medos. “Soma é o que eles levariam quando os tempos difíceis abrissem seus olhos”, canta o vocalista Julian Casablancas.
O produtor Gordon Raphael disse ao Sound On Sound em abril de 2002 como as músicas do álbum como Soma foram feitas faixa a faixa e esculpidas em sons de rock fora do padrão:
Passei muito tempo esculpindo a bateria e processando-a para que soasse como uma máquina. Eu estava pegando sons reais, abrindo a caixa de plug-in contendo compressores, EQ e amplificadores, e brincando até que algo real soasse como algo falso.
A cantora e compositora de rock Frankie Rose contribuiu com sua versão para o álbum tributo ao aniversário de 2011 Stereogum Presents… Stroked: A Tribute To Is This It . Ela disse sobre a experiência:
Para ser honesta, esta foi a primeira vez que realmente me sentei e ouvi The Strokes! Talvez isso pareça loucura como se eu estivesse morando em um arbusto ou algo assim, mas é verdade! tornar a música minha. Decidi diminuir a velocidade e tirar alguns elementos de garagem, achei interessante. Adicionar um sintetizador foi útil. As harmonias mantêm o refrão avançando como o original, mas totalmente diferente. Observe que há uma pequena homenagem no violão no final. Você consegue adivinhar para quem?
Barely, Legal
Esta faixa nervosa que também estava presente no EP The Modern Age mostra o vocalista do Strokes, Julian Casablancas, ficando amigo de uma garota ingênua que acabou de atingir a “idade legal” para trepar. Mas há algo interessante aqui além do significado e inspiração da música, embora ela seja popular entre os fãs, para Casablancas ela perdeu o sentido e estava esgotada. Ele explicou em uma entrevista de 2018 ao The Creative Independent :
As coisas que eu gosto não são as favoritas dos fãs, na verdade. Barely Legal meio que me faz estremecer um pouco. Eu entendo. É atrevido e jovem e eu não os julgo por pensarem assim, se quer penso sobre isso. Mas hoje em dia faço o que sinto que quero ouvir. Faço coisas que não registram tão alto no meu próprio medidor pessoal de cringe, mas o que isso significa para outras pessoas? Não só posso avaliá-lo pela maneira como me faz sentir ou de acordo com meus próprios padrões pessoais.
Essa faixa é a que mais soa com um post punk devido aos efeitos de distorção das guitarras. Soa também um tanto com a banda que Gordon Raphael em entrevista ao site brasileiro tracklist era a mais escutada pelos Strokes na época, o Guided By Voices.
Someday
Essa música é sobre a percepção da infância de que, à medida que você envelhece, você e seus amigos provavelmente se afastam. Apesar de toda essa melancolia, é uma das músicas mais animadas do álbum, – particularmente é minha preferida – contém a melhor levada das guitarras irmãs. Ela foi o terceiro single do álbum e nos EUA, atingiu o 17º lugar na parada de músicas alternativas.
No videoclipe, dirigido por Roman Coppola, The Strokes competem contra os roqueiros indie de Ohio Guided By Voices (banda que comentamos ser uma das inspirações deles anteriormente) no game show Family Feud, com o então apresentador Richard Karn presidindo. Slash, Matt Sorum e Duff McKagan conhecidos por terem feito parte do Guns N’ Roses também são mostrados trocando ideia com a banda em um bar. Interessante pensar que esses três pouco tempo depois se juntariam para formar o Velvet Revolver com o vocalista Scott Weiland e o guitarrista Dave Kushner completando o super grupo.
Fabrizio Moretti, o baterista do Strokes, estava de ressaca quando ouviu pela primeira vez o vocalista Julian Casablancas brincando com uma nova melodia que se tornou a base de Someday. Ele lembrou à NME :
Eu estava hospedado na casa de Julian depois de uma noite cheia de libertinagem … Eu estava com uma dor de cabeça louca quando acordei. Mas levantei com ele cantando no banheiro e inventando, meio que desenvolvendo a melodia para ela, e eu sempre achei isso realmente incrível. É uma melodia muito bonita.
Alone, Together
Esta música detalha um relacionamento tumultuado que simplesmente não está funcionando. O casal continua tentando, mas se machuca no processo, pois fica claro que eles não são certos um para o outro.
A abordagem improvisada que o produtor Gordon Raphael adotou na gravação de The Strokes fez com que fosse uma experiência árdua gravar essa faixa. Ele disse Sound On Sound:
Havia essa música chamada ‘Alone Together’, na qual fizemos três produções quase completas, com métodos diferentes e uma abordagem diferente a cada vez. Uma era fazer tudo ao vivo, outra era fazer com a bateria normal e a outra possibilidade era fazer com uma bateria eletrônica. Em cada caso, gravamos todas as faixas, construímos a produção e, no meio dos vocais, Julian dizia: ‘Não, eu odeio o jeito que essa coisa soa!’ Meu trabalho era realmente fazer todos eles felizes com sua música – eu gostaria que alguém tivesse feito essa abordagem comigo quando eu entrei no estúdio como músico – e se eles ouvissem uma música de volta e dissessem ‘Ooh, isso não soa bem‘, eu diria ‘OK, então vamos tentar outra abordagem. O que você sugere? O que não parece certo?’“
Last Nite
Uma semana antes do lançamento de The Modern Age chegar as lojas uma das faixas foi enviada para o New Musical Express para que fosse publicada em download gratuito no site do jornal. “Isso foi novidade e generosidade independente, conectou o grupo ao universo da música digital e também ajudou a aumentar o burburinho entorno da banda” na analise do crítico Ricardo Alexandre dono do podcast Discoteca Básica e que por muito tempo dirigiu a revista Bizz. A música escolhida foi a já clássica Last Night.
Essa é a principal faixa do álbum, o hit atemporal que transcende gerações. A primeira música a ser muito tocada nas rádios do The Strokes, Last Nite fala sobre um cara que deixa sua namorada depois que ela lhe diz que se sente chateada porque ele não se importa com ela. Ele então começa a ficar deprimido e questionar suas escolhas. Aqui é o vocalista Julian traduzindo as questões dos jovens de sua geração.
A revista de música britânica NME colocou Is This It em primeiro lugar em sua lista de álbuns da década. O vocalista do Strokes, Julian Casablancas, disse sobre o prêmio:
É totalmente louco! Eu não sei o que isso significa. Isso significa que é uma década musical boa ou uma década musical ruim? Eu não sei, sou um juiz tão ruim das minhas próprias coisas. Mas achei ótimo quando ouvi. Gravar o álbum foi divertido, estressante, emocionante. Acho que se eu soubesse que estaria tendo essa conversa agora, não poderia fique mais satisfeito. Estou me controlando agora, não quero me empolgar, mas estou muito empolgado comigo mesmo.
O vídeo clipe foi dirigido por Roman Coppola, filho de Francis Ford Coppola e irmão de Sofia. Para ele, os Strokes fizeram uma apresentação única, sem dublagem e tocando, aparentemente ao vivo, num programa de auditório estilo anos 1960. Apesar de, eventualmente, terem lançado bantes vídeos, a banda assinou com a RCA justamente porque foi a única gravadora que respeitou a decisão da banda de não fazer um vídeo musical. Apesar de não se importarem em tocar ao vivo diante de câmeras de televisão, eles eram contra esse meio de divulgação.
Outro ponto interessante na história da banda com os vídeo clipes é que a cena em que Casablancas joga seu pedestal de microfone foi mais tarde referenciada por The Strokes em seu clipe de 2011 para Under Cover Of Darkness, quando ele diz: “todo mundo está cantando a mesma música há 10 anos“.
Hard To Explain
Este foi o primeiro single do álbum. Embora não tenha chegado ao Hot 100 nos EUA, atingiu o 27º lugar na parada Modern Rock Tracks. Mas terem tomado a atitude de lançar ela primeiro para divulgar o álbum tem muito a ver com a afirmação que ela traz, que não é uma boa ideia tentar entender tudo – algumas coisas são do jeito que são e você não deve se preocupar com elas.
Casablancas também disse a Raphael que queria que o álbum soasse como “sua calça jeans favorita: não totalmente destruída, mas desgastada, confortável”. O produtor em entrevista falou que ao colaborar com o baterista da banda, Fabrizio Moretti, conseguiu um som diferente e difícil de reproduzir na faixa:
Ele abriu seu kit de bateria, e surgiu essa ideia por parte de Fab: ‘Talvez se eu colocar o chimbal a um metro e meio de distância do microfone da caixa, eu ainda possa tocá-lo com outra mão e manter o tempo, mas não haverá sangramento.’ Essa foi uma grande jogada, porque tínhamos um som ao vivo coerente, não um chimbal com overdub.
New York City Cops
De acordo com o líder da banda, Julian Casablancas, este seu hino anti-establishment contra a brutalidade policial foi escrito em resposta ao assassinato de Amadou Diallo em 1999. O imigrante guineense de 23 anos estava desarmado quando foi baleado e morto por quatro policiais à paisana na cidade de Nova York que pensaram que ele estava pegando uma arma em vez de sua carteira. A música estava originalmente no álbum, mas foi removida após 11 de setembro por causa da frase “Os policiais de Nova York não são muito inteligentes”. Na versão em CD dos EUA, foi substituído por “When It Started”.
A banda ensaiava naquela noite em Manhattan, como de costume. Lizzy Goodman, que escreveu o livro Meet Me in the Bathroom, sobre o renascimento da cena do rock de Nova York nos anos 2000, disse à BBC em 2019 que o evento catastrófico forneceu um pano de fundo “violento, destrutivo e traumático” para toda a urgente produção musical e hedonismo que se seguiu.
A tragédia de Amadou Diallo inspirou outras canções, American Skin (41 Shots) de Bruce Springsteen e Contempt Breeds Contamination de Trivium, mas a do Strokes sofreu represálias por conta do ato terrorista da Okaida ter ocorrido no ano do lançamento de Is This It. Em uma entrevista para a Vulture em 2018, Casablancas disse que a exclusão da música fez com que os fãs ignorassem outras mensagens políticas em suas primeiras músicas. “Quando NYC Cops foi tirada do álbum depois do 11 de setembro, o elemento político foi removido da narrativa da banda”, explicou.
Em fevereiro de 2020, os Strokes tocaram ela no comício Get Out The Vote em Durham, New Hampshire, em apoio ao candidato presidencial democrata Bernie Sanders. Em um momento surreal, policiais reais da cidade de Nova York subiram ao palco durante a apresentação para tentar controlar a enxurrada de fãs que pularam o trilho.
Abaixo deixo a versão mais espetacular da música quando os Strokes convidaram o Jack White para tocá-la com eles durante seu show de 2002 no Radio City Music Hall. Eram simplesmente o encontro das principais figuras do rock daquele início de década.
Trying Your Luck
Faixa foi originalmente nomeada como This Life e está presente na versão original com este nome no EP The Modern Age. Falando ao The Guardian em 2003, Casablancas admitiu que algumas das linhas de baixo de Nikolai Fraiture no disco foram “100% roubadas” dos reis indie-góticos do Reino Unido The Cure. “Estávamos preocupados em lançar o álbum, porque pensamos que seríamos pegos”, disse ele.
Saindo um pouco da piada e ironias de Casablancas, Os Strokes podem parecer cinco beatniks modernos com buracos em seus jeans, mas na verdade eles eram bem educados e todos tinham aulas de música. Um ponto importante do álbum é saber que o professor de guitarra JP Bowersock é creditado (no encarte como “guru”) por ajudar o guitarrista Nick Valensi e companhia a criar alguns dos solos matadores presentes na obra.
Eles também fizeram o gesto honrável de colocar a foto do produtor Gordon Raphael na contracapa do álbum onde se encontra a homenagem ao professor guru. Nenhuma banda fazia esse tipo de coisa, e toda essa mídia possibilitou o produtor a ficar conhecido, assim se tornou uma celebridade e um dos mais requisitados para a produção de álbuns na Inglaterra onde foi morar pós lançamento do Is This It.
Ainda dentro dessa categoria de bons moços, a capa do álbum é uma foto tirada por Colin Lane de sua então namorada. Ele tirou a foto por um capricho depois que ela saiu do chuveiro. A luva que repousa sugestivamente sobre ela foi deixada por um estilista em seu apartamento. Dois anos depois, enquanto fotografava o The Strokes para a revista The Face, a banda descobriu a imagem, enquanto folheava seu portfólio. Segundo o fotógrafo a esposa
Take It Or Leave It
Essa é uma faixa animal que ficou perfeita fechando o álbum, muita pressão e talvez a que mais entra nos conceitos punk presentes aqui. Considerado a “salvação do rock” em um momento de “renovação” do gênero em um mundo pós-Nirvana, “Is This It” fez barulho, conquistou público e mídia – a revista NME, por exemplo, classificou-o como o melhor álbum da década de 2000 – e influenciou toda uma geração de bandas similares, como Arctic Monkeys, Franz Ferdinand, Kings Of Leon e The Libertines.
Ao ouvir o álbum, o cantor e letrista do Killers, Brandon Flowers, decidiu jogar fora todas as suas músicas (com exceção de um, felizmente), pois sabia que não estavam à altura. “Eu realmente me senti deprimido por meses”, ele admitiu a Goodman.
A única música que mantivemos foi Mr Brightside. Todo o resto que tínhamos, sabíamos que não era bom o suficiente. Então começamos a construir de novo. The Strokes me ajudou a perceber que eu não era bom o suficiente ainda.
Essa influência se estendeu também ao Reino Unido onde eles eram como deuses. O chefe do Oasis, Noel Gallagher, disse recentemente ao Later… with Jools Holland que desde o lançamento do EP do The Strokes – que tinha uma versão inicial do grande sucesso do álbum Last Nite – eles instantaneamente “levaram a música de guitarra para outro lugar“.
Todo o período depois disso com The Libertines e Kasabian e Arctic Monkeys foi provavelmente o último grande período britânico para a música de guitarra E nos dois anos em que eles vieram para a Inglaterra, fomos a todos os lugares para vê-los, costumávamos ir a festivais apenas para vê-los, e eles eram brilhantes. Eles pareciam ótimos e pareciam anunciar um novo espírito na música de guitarra.
O frontman do Arctic Monkeys, Alex Turner, confirmou sua influência nas linhas de abertura do álbum mais recente de sua banda, Tranquility Base Hotel + Casino, cantando: ” Eu só queria ser um dos The Strokes… “. Eles fizeram alguns covers das músicas de Is This It como a faixa título em 2018 em Nova York e Take It Or Leave It em 2007 bem no início da carreira.
O Que disse a Mídia?
A banda não era levada a sério por causa de sua origem privilegiada. Casablancas, cujo pai fundou a Elite Modeling Agency, conheceu o colega de banda Albert Hammond Jr., filho do compositor Albert Hammond, em um internato particular na Suíça. Os primeiros críticos admitiram que The Strokes soava bem, mas não estavam interessados no que os “descendentes da riqueza” tinham a dizer sobre questões sociais e políticas. New York City Cops, seu hino contra a brutalidade policial, foi descartado pelo Pop Matters , que perguntou: “O que um garoto rico está fazendo reclamando dos policiais de Nova York?” . Entretanto, os caras eram os queridinhos da NME que em 2009 nomeou Is This It como o melhor álbum da última década , superando Up The Bracket do The Libertines, e XTRMNTR do Primal Scream. Já a Rolling Stone, em abril daquele ano, em seu especial “What’s Cool Now” (O Que É Legal Agora), elegeu o Strokes como “a próxima grande banda do rock”.
Vinte anos atrás, os Strokes se propuseram a fazer um disco que soasse como um disco vintage que você encontraria no futuro. Usando o pouco equipamento que tinham disponível, um estúdio sombrio e um produtor underground, eles acertaram o alvo. Ponha o Is This It para tocar hoje e você ouvirá um som vintage bem aqui no futuro. E, nas palavras do produtor Gordon Raphael, “músicas bem elaboradas nunca saem de moda – não importa de que época sejam”.
Davi Santos, Pop Line, 2021
The Strokes. De início, tudo o que você precisa saber é o nome desse quinteto de garotos de Nova York, todos com idade entre 20 e 22 anos. Nova sensação do rock, “novo Nirvana”, “next big thing”, a salvação da lavoura?
Lúcio Ribeiro, Folha de São Paulo, 2001
É cedo para afirmar, mas há muito tempo a cena roqueira não ficava tão excitada com um grupo novo como agora, com Strokes.
Então, como é a melhor banda de rock jovem da América? Frenético, para começar. As onze músicas de Is This It são pura velocidade em pouco mais de meia hora, cada uma tão bem construída e entregue com urgência, que até as baladas parecem rápidas. Os Strokes são obcecados por ritmo e, às vezes, sua abordagem é mais parecida com a de uma banda de soul ou funk do que de uma banda de rock: cada músico, até o baterista, empurra a melodia de um ângulo rítmico diferente até que não haja mais ângulos restantes. Explorar. As partes de guitarra rítmica entrelaçadas e incessantes de Albert Hammond Jr. e Nick Valensi liberam o baixista Nikolai Fraiture para adoçar músicas como Someday, Last Nite e a faixa-título com graciosas contra-melodias ao estilo da Motown. Em The Modern Age, Hammond Jr. e Valensi trabalham as coisas em um frenesi, dobrando o ritmo e gaguejando ao redor da batida, então empurrando a melodia para o céu no refrão com ascendente, acordes circulares até que não haja para onde ir, a não ser mais longe.
Joe Levy, Rolling Stone, 2001
Moda. It’s a bitch. Ascendendo bandas medíocres a alturas de popularidade injustificada e derrubando os realmente grandes ao status de “animal de estimação dos críticos”, o hype se tornou uma praga em qualquer banda que espera alcançar a adoração desenfreada entre os elitistas da música. Quando os caçadores da mídia cheiram o sucesso e respondem com seu grito anual de “salvadores do rock and roll”, a decepção é inevitável. Assim acontece com os Strokes, uma banda que teve publicidade suficiente em 2001 para deixar Bin Laden com ciúmes.
Ryan Shreiber, Pitchfork, 2001