Revisando Clássicos: Arctic Monkeys – Whatever People Say I Am, That’s What I’m Not

Bem vindos a mais um revisando clássicos, aqui analisamos discos atemporais que, de alguma forma, marcaram a história da música de maneira revolucionária. Traremos uma introdução ao álbum contando fatos que o fizeram importante para a carreira da banda, um faixa-a-faixa (excepcionalmente neste reduzido) e, por fim, citações das principais mídias especializadas em reviews. O álbum de hoje é o peculiar e aparentemente tão distante álbum de estreia do Arctic Monkeys, o Whatever People Say I Am That’s What I’m Not.

Introdução ao álbum

Quando se chega aos 15 anos de idade, costumam dizer que se entra na adolescência, se torna um “rapazinho” ou “mocinha”. Acredito que muitos não saíram dessa fase justamente por conta de discos como o Whatever People Say I Am, That’s What I’m Not. Ele foi confeccionado no período entre 2005 e enfim lançado em 2006, o rock estava em alta e uma gama de sub-gêneros dominava as rádios pelos frutos da década de 90. Estava em decadência o pop das boybands e girls group, essas vertentes do pop perderam força e o hip-hop junto ao rap tomaram a frente e assumiram a rivalidade com o rock além de em alguns casos ter a união dos gêneros, instabilizado por bandas como Green Day, Libertines, System Of Down, The Killers, Franz Ferdinand, Audioslave, Foo Fghters, Queens Of Stone Age e Strokes. Essas duas últimas seriam a influência mor para a inspiração dos então jovens de Sheffield que compõem o Arctic Monkeys.

O ano é 2006, o Strokes já havia lançado seus principais álbuns da carreira: Is This It, Room On Fire e First Impressions of Earth. O álbum Songs for the Deaf do Queens Of The Sonte Age já era considerado um novo clássico e Jay Z, 50 cent, Tupac, Notorius BIG, Snoppy Dog entre outros, estavam na crista da onda colocando o gueto americano no mainstream da indústria música mundial. Nesse momento, em Sheffield, Alex Turner (vocalista, guitarrista e principal compositor do Arctic Monkeys), que estava com seus 20 anos, se inspirava, não só nessa galera, mas também na cultura pop e em filmes cult como Saturday Night and Sunday Morning. Turner utilizou a frase da fala do personagem de Albert Finney no filme para intitular o álbum.

A gama de influências pop e cult além das musicais foram tão relevantes para o sucesso desse disco que se quer Turner e seus companheiros se quer sonhavam que com o tão divertido, vigoroso, dançante e com temáticas adolescentes álbum de estreia dariam o ponta pé inicial para se tornar uma das últimas e autênticas bandas de rock no mainstream – sempre foram muito pés no chão. A expectativa era tanta que o álbum se tornou o álbum de estreia com vendas mais rápidas na história britânica (até Leona Lewis arrebatar o disco deles). Mesmo assim, a banda ignorou o hype sem esforço, uma prova de que eles eram tão baseados na realidade quanto sua música.

O vocalista atingiu uma linguagem ao nível de um trovador e bem poética para retratar a adolescência de um britânico desesperançoso dos anos 2000 soando bem cool. O baterista Matt Helders mostrava seu promissor talento, assim como Jamie Cook com sua peculiar forma indie de tocar guitarra com acordes rebuscados e solos simples. O baixista oficial e que gravou o álbum foi Andy Nicholson, esse não ficou na banda por questões respiratórias que não o permitiam viajar em turnê.

Esse rock and roll, hein? Esse rock and roll, ele simplesmente não vai embora. Ele pode hibernar de tempos em tempos e mergulhar novamente no pântano. Eu acho que a natureza cíclica do universo em que ele existe demanda que ele siga algumas de suas regras.

Alex Turner no Brit Awards em 2014

FAIXA-A-FAIXA

Um faixa-a-faixa se torna conveniente, mas não seguiremos a ordem numérica e sim a de importância, não só em termos mercadológicos, mas também para a história da banda.

The View from the Afternoon

Essa faixa não tem muitas questões filosóficas apesar do seu nome bem poético, Alex Turner disse “Esta é uma das últimas músicas escritas para o álbum. Não há nada inteligente, é apenas sobre antecipar a noite, encontrar conforto na familiaridade e no fato de que você sabe que está fadado a enviar uma mensagem maluca ou algo assim antes de o sol nasce. Acho que parei de fazer isso agora.

Ela é uma das que são revisitadas pela banda em seu momento atual que já está sonoramente muito distante do que fez eles se tornarem uma sensação indie. Uma questão outrora foi levantada pelo baixista do Bombay Bicycle Club, segundo ele, “o Arctic Mokeys seria o responsável pelo Indie ruim dos anos 2000“. Essa sacaneada pode até ser válida pelo humor, porque muita banda de gosto sonoro questionável teve eles como maior referência, mas é de certa forma canalha já que o AM se dá ao luxo de ser o que o som indie teve de melhor naquela época.

I Bet You Look Good On The Dancefloor

O nome Arctic Monkeys foi inspirado num grupo do qual o pai do baterista Matt Helders fez parte nos anos 70. E se há uma música que os define, que é aquela que não pode faltar em um show, que rendeu à banda uma indicação ao Grammy em 2007 de Melhor Canção de Rock Instrumental, aquela que ganhou a melhor faixa no NME Awards de 2006, que também os ajudou a conquistar o prêmio de Melhor Nova Banda e Melhor Banda – a primeira vez que alguém conseguiu todos os quatro troféus em um único ano e que por fim foi tocada no evento mais importante da Grã-Bretanha dos últimos tempos, na cerimônia de encerramento das olimpíadas de 2012 ocorrida em Londres, esta canção é I Bet You Look Good On The Dancefloor.

Apesar de ter se cansado dela, Alex Turner afirmou que é uma das que a banda mais gosta de tocar tanto pela receptividade do público, quanto pelas formas de explora-la. A música tem várias questões interessantes também. No trecho “Seu nome não é Rio, mas eu não ligo para areia ” há uma referência direta ao hit dos anos 80 do Duran Duran, Rio. A banda faria referência à banda novamente em sua canção de 2007, Teddy Picker.

Fake Tales of San Francisco

A banda de Sheffield gravou todo o álbum nos estúdios Chapel, um condado situado na região leste da Inglaterra. Fake Tales Of San Francisco foi a primeira música gravada por eles, o que traz uma certa preciosidade. A primeira vez que ela apareceu foi no ep Five Minutes with Arctic Monkeys, de maio de 2005.

Ela é uma tiração de sarro com bandas de Sheffield que se “americanizavam” em busca de adoração. A letra da música descreve as ridículas tentativas de uma banda fictícia de South Yorkshire de se mostrar “descolada”, tomando como inspiração os Estados Unidos sem nunca ter estado lá; mas que acaba se mostrando terrivelmente fraca. A canção apresenta um tom bastante debochado, com versos afiados como “it’s the proof that love’s not only blind but deaf” (é a prova de que o amor é tanto cego quanto surdo) e “You’re not from New York City, you’re from Rotherham” (você não é de Nova York, você é de Rotherham). Ironicamente a canção rapidamente se tornou uma das favoritas do público americano.

Dancing Shoes

“A coisa que mais me marcou foi assistir ao concerto dos Queens of the Stone Age num festival… assim que eles saíram do palco, pensei: preciso começar a tocar de uma maneira mais pesada.” Disse Helders, o baterista em uma entrevista. Dancing Shoes certamente faz parte dessa afirmativa. É notória na sessão rítmica a inspiração da banda de Josh Homme.

Dancing Shoes é certamente a música mais dançante da história da banda. seu ritmo é envolvente mesmo com as guitarras bem distorcidas. A levada da batera soa como música latina, é legal ver que as guitarras e baixos em sua maioria fazem a melodia baseadas na forma que a bateria rege a música. os riffs usados aqui dizem muito mais a percussão do que a linha vocal.

You Probably Couldn’t See For The Lights But You Were Staring Straight At Me

Essa é uma música que traz a revolta de se apaixonar, ela possui o título mais longo dentre as canções do álbum e provavelmente dentre todas da banda. Todavia, ele é perfeito para caracteriza-la.

Ela é uma das músicas mais inspiradas no punk rock – como bem visto por diversas referências do jornalismo musical – aqui tem uns riffs que não seria exagero dizer que o The Clash ou o Buzzcocks utilizaria.

Still Take You Home

A música Still Take You Home é a única faixa em um álbum do Arctic Monkeys que apresenta um crédito de escrita para qualquer outro membro da banda além de Alex Turner – com o guitarrista Jamie Cook contribuindo para as letras.

Segue sendo tocada até hoje por eles. Ela tem um vigor incrível, é barulhenta e direta, tem essa coisa da inspiração na música mais falada do que cantada pega do hip-hop, só que em velocidade e no sotaque de Sheffield, que é o principal diferencial dos “Macacos” para as demais bandas.

Riot Van

O álbum é o único que o colaborador frequente James Ford não produziu para o grupo. Desde então, Ford produziu ou co-produziu cada um de seus seguintes álbuns de estúdio. Ele, no entanto, tocou piano elétrico e órgão em Riot Van.

Uma “van de choque” é um veículo da polícia que pode conter várias pessoas, permitindo que os policiais façam várias prisões durante um distúrbio público. Nos Estados Unidos, o veículo costuma ser chamado de paddy wagon. Esta música traz um sarcasmo interessante já que ela é uma balada que fala sobre um grupo de jovens britânicos rebeldes que insultam a polícia até que um deles finalmente é jogado na van de choque e levado embora.

Red Light Indicates Doors Are Secured

Aqui Alex traz uma forma de relatar algo que aconteceu em um dia de saída com os amigos. Como se estivesse contando em um diário ou mesa de bar, talvez hoje em dia n twitter. um ritmo 6/4 pra encaixar com a história, que mesmo sem pé nem cabeça alcança o público se tocada graças ao ritmo meio introspectivo e dançante ao mesmo tempo, mas reconheço que ela em um show traria aquele momento de buscar uma cerveja ou ir ao banheiro.

Mardy Bum

Certamente a queridinha do álbum. A segunda balada do álbum tem o riff bem empolgante capaz de fazer uma multidão cantá-lo junto. Fora a letra bem agradável que traz a interpretação de um admirador frente aos dois estados comuns que sua amada traz durante a convivência. O legal dessa música é que ela não chega a ser uma canção de amor, mas também não é uma música que critica a pessoa só, é bem otimista e remete a algo dito uma vez por Rita Lee: “é o odiar por tanto gostar“.

Ela nos últimos anos, quando foi reintegrada ao repertório recebeu arranjos de cordas em uma versão mais acústica tendo só Turner no violão e Cook tocando uma parte dela acompanhado da orquestra até entra Helders e Nick O’Malley que substituiu Andy Nicholson já em 2007. Tal versão marcada na presentação no Glastonbury de 2013 para muitos se tornou a definitiva, mas em carater de trzer ela em sua essência trago a performance no T In Park de 2006.

Perhaps Vampires Is a Bit Strong But…

A banda teve alguns grandes shows nesses idos 2006, um deles foi o do Reading Festival. Eles estavam cuspindo fogo e uma música que se destaca por sua performance visceral é a estranha Perhaps Vampires Is A Bit Strong But… Ela traz uma parte de improviso intensa com uma linha de baixo fantástica e a bateria de Helders a pleno vapor, parece um motor de 1.578 cavalos de potência.

When The Sun Goes Down

Essa música era originalmente conhecida como “Scummy”. Certamente um dos maiores acertos de Alex Turner, principalmente se for levado em conta que foi o segundo número 1 consecutivo do Arctic Monkeys no Reino Unido após seu lançamento de estreia I Bet You Look Good On The Dancefloor. A grandiosidade da música é tão grande que ela inspirou Scummy Man , um curta-metragem lançado em DVD pelo selo Domino Records, do Arctic Monkeys. Conta a história de uma noite na vida de uma prostituta adolescente e viciada em drogas.

Certamente uma das melhores músicas do álbum por conta dessa variação do seu início lento contando a história e depois entrando a pancadaria. Em shows ela costuma ser bem celebrada e agita a galera.

From The Ritz To The Rubble

Essa música é o lado B do single lançado com Fake Tales Of San Francisco no intitulado Five Minutes with Arctic Monkeys . Essa pérola foi um lançamento limitado pela Bang Bang Recordings – uma gravadora criada pela banda com o único propósito de lançar o single. O nome, Bang Bang, foi cogitado como um nome de substituto da banda, com base em que o nome Arctic Monkeys soava “bobo”.

essa música é bem frenética e até hoje é tocada, assim como ocorre em Red Lights, Alex retrata uma situação do cotidiano e criticando seguranças que não permitem a entrada de pessoas em festas e questiona o porque disso claramente com raiva.

A Certain Romance

Essa música é uma das que rolava na internet no início das redes sociais de músicas como o My Space. Sem os caras da banda saberem alguns sons do primeiro single e os potenciais hits de Whatever People Say I Am That’s What I’m Not já estavam nas redes. Isso se deve ao fato deles terem no início distribuído gratuitamente em seus pequenos shows em pubs cds contendo as faixas. Tal ação foi circunstancialmente boa, porque as redes sociais estavam crescendo e a divulgação dos sons foi massissa.

A Certain Romance é uma das músicas mais singelas já feitas por Alex Turner, bem bobinha e ao mesmo tempo poética diria. Infelizmente a banda não a toca com frequência. Provavelmente por ser a música que demonstra mais imaturidade do álbum, ser a música mais adolescente e que dificilmente se conecta com o tipo de som que a banda faz hoje em dia. Talvez a romantização dessa fase da vida não agrade mais Turner.

A melodia dela é uma das coisas mais interessantes do álbum, da bateria pesada da introdução a uma forte presença do baixo na melodia.

Bem, eles podem usar seus Reeboks clássicos
Ou seus all-star acabados, ou calças largas enfiadas nas meias
Mas tudo isso não é a questão
A questão é que não existe mais romance por ali

Leve Before The Lights Come On

Temos aqui uma menção honrosa para essa canção que apesar de ter sido gravado na época das sessões do álbum, Leave Before The Lights Come On não foi incluído e foi lançada apenas como single independente em agosto de 2006. Continua sendo o único single que a banda lançou para não figurar em um álbum de estúdio, o que considero um pecado.

É mais uma balada e consegue ser tão genial quanto qualquer trabalho do álbum ou de trabalhos posteriores. Arrisco a dizer que ela não entrou justamente por ser uma balada e ter certa similaridade com A Certain Romance.

O Que disse a Mídia?

De uma forma geral o álbum na época foi um tanto julgado pela imaturidade das temáticas das letras e celebrado pelas melodias criativas. Hoje em dia ele é visto com um ar nostálgico e representou a adolescência de muitas pessoas, o que mudou as críticas e parando pra pensar, é o único álbum dos garotos a estar presente no livro “1001 discos para escutar antes de morrer” justamente por essa questão identitária.

As observações hiper-realistas de Turner ajudam a explicar por que seu grupo inspira tanta lealdade. Ele documenta sem rodeios a vida de jovens clubbers do norte da Inglaterra em um clima intensamente regional de Yorkshire, uma estrela improvável que descreve uma vida noturna decididamente nada glamorosa. Whatever People Say I Am é praticamente um álbum conceitual antiquado sobre boates da classe trabalhadora, um Saturday Night Feverpara os filhos e filhas britânicos de pais criados no disco e no punk.

Rolling Stone, 2006

Não seria nenhum absurdo dizer que muita gente se apaixonou pelo Indie Rock e foi vasculhar o que mais o estilo tinha a oferecer só por causa deste álbum. De certa forma, ele pode ter sido uma porta de entrada para um universo completamente novo e por isso tanta gente pode o considerar, talvez, o melhor álbum da banda, não pelo que sai das caixas de som, mas pelo que ele representa para si.

Monkey Buzz,2014

O que deve ser diferente no Arctic Monkeys às vezes são letras fortemente expressivas e aquela história de fundo irresistível. Os defensores mais perspicazes da banda comparam seus contos difíceis aos de seus predecessores, como Specials, Smiths, Pulp e The Streets. Mas extrair letras do dia-a-dia ou articular a insatisfação de muitos é um negócio arriscado e difícil e, ao contrário dos listados acima, os Macacos não fazem contos de ansiedade cotidiana, mas apenas reclamando de seus primeiros passos na vida noturna, desentendimentos com seguranças, policiais e colegas de escola. Então, eles são os emo do Reino Unido, pintando retratos diários de uma cidade pequena e da vida suburbana para adolescentes em um país onde o fundamentalismo é lealdade a um clube de futebol, e não à religião.

Pichtfork,2006

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